sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Raimunda Leite da Cruz: Alguns Traços Históricos






Informes iniciais: Conforme pesquisas, Raimundo significa protetor ou sábio, pessoa muito rigorosa consigo mesma, com tendência a isolamento e a supervalorização das virtudes de outrem. Quando consciente de sua importância, pode tornar-se conselheiro e sustentáculo. Dizem ser palavra de origem francesa: do gótico "protetor, poderoso". No entanto, outros acreditam que a palavra provém de Ramiro, nome de origem alemã, de onde deriva Radamir, cujo significado é: "conselheiro ilustre, famoso". Derivando Raimón = Raimundo.

Local de Nascimento: Raimunda Furtado Leite nasceu em Pedreiras (Ma), no bairro "Anjo da Guarda" (?), em 4 de agosto de 1924, casou-se em 1939, com 15 anos de idade, com Raimundo Cesário Cruz, seu primo em primeiro grau, tendo falecido em 30 de agosto de 1964.
O Casamento: Segundo informações colhidas junto a vários familiares, o casamento ocorreu de modo singular. Os primos namoravam e tinham intenção de realizar um casamento que, por precoce, provavelmente, seria contrário à vontade dos pais. Por isso, planejaram fugir e por em prática seus intentos. Entretanto, o pai da jovem, tendo se deslocado da Trindade à Pedreiras para participar da missa dominical, lá, tomara conhecimento do plano dos jovens e, quando regressou, passou pelo Altamira para acertar as coisas. Deve ter havido uma conversa amistosa com a filha que culminou na aprovação do seu casamento. Certamente, conviria mais a ele um casamento precoce do que o vexame da fuga de dois jovens embevecidos de amor.

A Festa no Altamira: Dizem que a festa do casamento ocorreu na casa de tio Joaquim Cesário Cruz (Quinco Cesário), o pai do noivo, tio da noiva, no Altamira, propriedade situada no caminho da cidade, entre as terras dos Cardosos e Augustinhos, na planície do importante Igarapé da Agricultura que irriga as terras de meu padrinho Bello Xavier.
Meus pais aprovaram o casamento porém não participaram. Fizeram-se representar por minha irmã Maria e seu esposo Manoel Martins dos Santos (Nezinho).

Altamira: Viajando de Pedreiras para a Trindade, trilhei muito pelo caminho que passa por esta localidade, quase uma trilha de roça, cortando morros e vales lamacentos povoados de palmeirais. E lembro-me bem da linda propriedade chamada Altamira. Nela havia uma bela casa, provavelmente remanescente de antiga fazenda de escravo, cercada de fruteiras, numa colina, afastada cerca de 500 metros do caminho geral. O acesso era feito por uma cancela e um corredor de cercas onde podiam ser vistos belos exemplares senis da elegante palmeira-real, provavemente, plantados na segunda metade do século XIX.


“Espada Velha”, uma Cobra no Caminho: Neste caminho, num momento posterior, passei por um teste perigoso. Era final da temporada de chuvas, provavelmente, abril ou maio, ocasião dos preparativos para dar início à moagem da cana e a produção de aguardente, rapadura e açúcar, atividades principais da estiagem.
Assim, meu Pai,.meu irmão Antônio e eu, regressávamos de Pedreiras para a Trindade, por aquele caminho, conduzindo um animal e preciosa carga: o "Pé-de-Dorna", um tipo de garapa azeda usada na fermentação do caldo-de-cana e produção de cachaça. Caminhávamos em fila, atrás da mula: Antonio, eu e, por fim, meu Pai. Ali, naquele trecho de caminho do Altamira, havia um tronco de pinhão-roxo cortado, deitado ao chão, medindo de 10 a 15 cm de diâmetro. Por baixo, escondia-se uma cobra “Espada-velha”. Creio que ela despertou com os primeiro caminhantes e quando chegou minha vez de cruzar o tronco ela deu o bote, picando meu dedo indicador do pé esquerdo. Tomei um susto danado quando senti arder o dedo vi a cobra. Comecei a pular e pular..., tentando cair fora. Quando, finalmente, consegui libertar-me daquela situação, meu pai quis matar a cobra porem, ela já estava morrendo. Creio que a matei pisoteada, movido pelo pavor. Resultado: meu pai espremeu o local da picada, mandou-me meter o pé na lama. Depois, ele queria passar pela casa do Alves, um Sr. curado de cobra, para pedir-lhe o remédio definitivo: uma cuspida na boca para matar o veneno da cobra. Eu me dispus a atolar o pé em todo lameiro do caminho, para não me submeter à tortura da cuspida. Que coisa louca !... Felizmente, não tive problema. Daí por diante, passaram a crer que eu seria mais um privilegiado, curado de cobra, podendo dar minhas cuspidas.

Onde residiu o novo casal?: Não tenho informação sobre o local de residência do novo casal durante os dois primeiros anos de vida conjugal, provavelmente lá mesmo no Altamira. O certo é que, em outubro 1941, residia na Trindade, numa antiga casa, à beira do riacho, onde foram construídas nossa residência definitiva e a nova casa de engenho, após o incêndio da casa da colina, do lago.

Nascimento de Inácio: Tenho lembrança de que, ali, nasceu o primeiro filho de minha irmã Raimunda, Inácio Cesário Cruz. Naquele dia, com pouco mais de 3 anos de idade, eu não sabia o que estava acontecendo do lado interno daquela casa cercada de mangueiras e laranjeiras, naquela beira de caminho do rio Mearim. Era um grande alvoroço, corre-corre, pra dentro e pra fora, e ninguém me dava qualquer explicação. Crianças não podiam chegar perto. Amedrontadas, eram afastadas dali sem qualquer explicação sobre o que se passava na casa.
Segunda Lembrança Mais Antiga: Creio que esta deve ter sido a minha segunda lembrança mais antiga, visto que a primeira, foi aquela em que meu pai salvou-me de entre os chifres dos bois Moreno e Azulão.

Seria um Novo Incêndio?: Eu já havia presenciado a correria de um incêndio. Aquele que destruíra nossa casa da colina, acontecimento guardado apenas em meu subconsciente, pois confesso que não lembro absolutamente nada dele. Estaria ocorrendo, ali, outro incêncio ...? Felizmente, não se tratava disto mas, dos preparativos para a chegada do meu sobrinho Inácio.

O Nome e a Promessa: O nome Inácio fora dado ao recém-nascido, segundo fui informado, para assegurar-lhe a sobrevivência, tendo em vista que três outras crianças nascidas anteriormente, não haviam sobrevivido.
Pesquisas apontam que Inácio significa ardente e indica uma pessoa vivaz e inteligente que, em geral, amadurece com as dificuldades. Supera obstáculos com bom humor e perseverança. Há quem atribua ao nome Inácio origem etrusca. O fato é que, na história, aparece registrado como sobrenome pelos antigos romanos.

Relato de Sinhara e Judite: A seguir, apresento um relato elaborado por minhas irmãs Judite e Sinhara sobre esta matéria: "Primeiro vamos falar sobre a nossa casa na trindade, a 1ª casa foi queimada em 1940 + ou - em dezembro. Depois que a casa queimou, fomos morar na casa do engenho no mesmo lado do lago, o caminho ficava no meio entre a queimada e o lago. Perto da casa do engenho tinha um caminho que ia até o brochado (1). Nezinho morava no mesmo lado, em uma lombada, antes da casa do engenho velho; de lá, ele via o fogo e foi ajudar a apagar. Os moradores da Trindade, ao ouvirem a zoada do fogo na casa, pensavam que era barulho de avião, algo difícil de se ouvir, na época. Somente após se haver espalhado a noticia os moradores correram e, certamente, ainda puderam ajudar no salvamento. Foi aproveitado apenas um pouco do milho e do arroz. Na casa do engenho não dava para morar, então o Pai comprou uma casa do Sr. Alípio. Ela ficava próxima ao terreno onde ele construiu, posteriormente, a morada definitiva. Uma bela casa de taipa, coberta de telha".
"Sobre Raimunda: ela não chegou a fugir. Pai havia vindo a Pedreiras onde ouviu boatos afirmando que Raimundo Quinco iria roubá-la, e que o Pai dele estava de acordo. Nosso Pai passou lá, no Altamira, e declarou que não precisavam roubá-la. Afirmando que, mesmo contra sua vontade, iria aceitar o casamento e, gostaria que o mesmo fosse realizado logo.
Quando ela casou, ficou morando em Altamira, logo ficou grávida e acabou perdendo (sofreu um aborto) com poucos meses, depois do 2º aborto ele mudou para a Trindade, para a casa da beira da estrada, perto da bagaceira do engenho. Ele foi trabalhar no engenho do sogro. Houve o 3º aborto. Então aconselharam que ela deveria fazer uma promessa com Santo Inácio para não mais perder as crianças. A promessa era assim: o primeiro filho que nascesse vivo e de tempo normal se chamaria Inácio. Feita a promessa, a gestação transcorreu normal, a criança nasceu em paz e recebeu o nome Inácio, como prometido. Dai por diante, nasceram-lhe e foram criados mais 12 filhos.
OBS: conforme prometido, são palavras da minha mãe Judite e da tia Sinhara....um abraço....Janaina.
(1) Uma região de lagos, planície inundável do rio Mearim, onde se faziam as plantações de vazantes, especialmente de melancia e melão.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

VISTA, Florianópolis_SC/ AV. HERCÍLIO LUZ/ Trav. Missão Jovem-PIME/ Pe. PAULO DE COPPI.



Em final de 1986, retornei a Florianópolis com minha família. Haviamos residido nesta cidade entre  novembro de 1977 e março de 1983. Fomos transferidos para Salvador-Ba no início de 1983 onde moramos até o final de 1986. 
Portanto, estavamos de volta à bela Florianópolis, e passamos a residir na Av. Hercílio Luz, neste Apto. 603 do  Edifício Luxemburgo, ao lado de uma Servidão que, depois, levou o nome de Missão Jóvem, por iniciativa do incansável empreendedor Padre Paulo de Coppi, nosso particular amigo. 
Padre Paulo, após longos anos de trabalhos no Amapá, veio residir no bairro Pantanal, em Florianópolis, onde fundou um jormal de cunho religioso denominado "Missão Jóvem". Em seguida, adquiriu uma residência na referida Servidão, confrontando com o terreno do Colégio Coração de Jesus e com o do Edifício Luxemburgo, onde residimos. 
Na Servidão, à frente da casa adquirida pelo Padre Paulo, havia um terreno baldio que, na época da nossa chegada, estava ocupado com alguns eucaliptos. Este terreno baldio pertencia a um médico oftalmologista que resolveu construir um edifício (visto no vídeo) para implantar sua clínica oftalmofógica.
Fazem 25 anos que residimos aqui e acompanhamos o desenvolvimento desta parte da cidade em todos os seus detalhes. A cidade cresceu verticalmente e a floresta do Morro da Cruz está perdendo espaço para as construções de todos os tipos.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

VIVA EM HARMONIA COM A NATUREZA


Filho, devagar com a colher ...! (*)

O artigo considera a necessidade de se fazer uma convocação geral para avaliar o modo como se vive e se opera o relacionamento entre os seres humanos e a mãe natureza.

A história nos fala de antropofagia: antes de se tornar civilizado, o ser humano podia estar à mesa do banquete como conviva ou refeição, e isto o tornava semelhante aos outros animais e plantas. É claro que o homem adaptou-se e isto significa, dentre outros, passar a eliminar, domesticar e submeter seres vivos. Ele detém o domínio, as rédeas. Sentado, praticamente só à cabeceira da mesa da mãe natureza, com voraz apetite, não se dá conta de que muitos deliciosos pratos já não lhe são servidos e que é preciso moderar o apetite. 
Quantos seres humanos passaram, também, a ser prato do dia na dura luta pela sobrevivência e ocupação de um espaço na bendita mesa natural?
Estaria ocorrendo hoje uma nova fase de antropofagia? 

O grande desafio: conhecer, bem administrar e preservar os recursos naturais, dentre os quais o ser humano também é incluindo.

Recadinho amável: "Filho, vai devagar com a colher porque a marmita já está ficando vazia!..."

Passo fundamental: É preciso investir para conhecer o meio ambiente, bem administrá-lo e usufruir de seus múltiplos benefícios com prudência e parcimônia. Ninguem ama e proteje o que desconhece. Esta tarefa é de responsabilidade, principalmente, do município, linha de frente dos conflitos de uso da terra, onde o povo reside, trabalha e produz. 
A boa gestão dos recursos naturais passa pelo entendimento da vocação natural do ambiente, das terras e da população municipal; alem de viabilizar um rendimento mais sustentável dos bens naturais, cria possibilidades para melhor repartição de benefícios dos recursos. 
Para uma boa administração, as prefeituras precisam criar bancos de dados com as informações básicas municipais, incluindo o potencial dos recursos naturais, do meio ambiente e do uso da terra, em geral. 
Um prefeito interessado em conhecer a vocação do seu município para bem administrá-lo, em benefício da população, é mais valioso do que outro, que esteja preocupado, apenas, em ser um bom político afeiçoado a clientelismo /favoritismo.

Concluindo: A população, em geral, deve propugnar por mudança. Exigir e apoiar o poder público municipal na realização de pesquisas consistentes que garantam melhor utilização e repartição de benefícios dos bens naturais. Esta é a regra natural: conhecer para bem administrar e preservar, tendo-se em vista que não somos as últimas gerações a viver neste planeta. 
Os bens naturais são as delícias do banquete da vida. A mesa do banquete permanece posta pelos séculos e, embora muitos se retirem, a cada dia, novos e numerosos convidados nela tomam assento.  Estatísticas demonstram que na terra, a cada segundo, dois seres humanos se vão e cinco, se achegam à mesa do banquete da vida. 


(*) Artigo de Pedro Furtado Leite, Eng. Florestal, Fitogeógrafo, aposentado.

Agua e Vida: Movimento e Energia Criadora


Ponta de Baixo - Baía Sul - Florianópolis. Out./2010.
Água é fonte de vida e a vida não subsiste sem água.

De onde procede a água ?

De onde, a vida ?

Há mais perguntas do que respostas...

A vida contemplada como força criadora capaz de evoluir e adaptar-se, para subsistir através dos tempos e realizar o seu desígnio universal, é como um rio caudaloso encaminhando-se para o mar, um manancial vivo e resoluto, uma torrente de infinitas possibilidades, é uma fonte inesgotável de energia em movimento.
A vida é a força e a inteligência que anima a matéria dando-lhe forma, dimensão, movimento e evolução no espaço/tempo, cumprindo os desígnios da Criação.
A matéria é para a vida como o barro nas mãos do oleiro: calcado, moldado e vitalizado. Quando o jarro não atende as expectativas do oleiro, é retrabalhado e renovado. A vida nunca se fadiga de seguir sua marcha moldando a matéria no espaço e no tempo. Das formas antigas e gigantes como os dinossauros às mais atuais como o Homo sapiens e da Ginkgo biloba às orquídeas, das bactérias às sequóias, a vida trabalha transformando a matéria
O fluxo vital é como o rio de águas edificantes, invencíveis, que desce de altas montanhas criadoras, percorre encostas tortuosas da matéria, vencendo obstáculos os mais diversos, enverdecendo e movimentando tudo, para honra e glória daquele que o projetou.

Bendito seja Deus pela água e pelo dom da vida !...

Pedro Furtado Leite




quarta-feira, 18 de agosto de 2010

RAIMUNDA E PEDRO: CAMINHO DA ROÇA

Residindo na Trindade, minha irmã e seu marido, meu primo Raimundo, integraram-se aos afazeres gerais da família: na casa, na roça e no engenho.
A luta da roça tinha início com a derrubada e broca do mato; a queima e a limpeza (coivaramento) de resíduos; operações, geralmente, realizadas entre setembro e outubro de cada ano. Seguia-se o plantio, principalmente, de arroz e milho; depois, de janeiro a março, a capina. A colheita, geralmente, ocorria entre março e maio.
De modo geral, cedo os homens partiam para a roça e só retornavam à tardinha. O almoço lhes era levado ao meio dia. Eles almoçavam numa cabana improvisada ou embaixo de alguma árvore frondosa da beira do roçado onde, geralmente, mantinham alguma cabaça com água potável e pedra de amolar facão.
Raimunda, muitas vezes, era a responsável por fazer chegar até eles o precioso alimento condicionado numa grande bacia de alumínio amarrada em pano de prato.
Geralmente, eu era convocado para lhe ajudar a carregar o almoço, fazendo-lhe companhia na caminhada, às vezes, longa e difícil.
Certa vez, levavamos o almoço ao pessoal que trabalhava na roça, para o lado do Brochado, região de várzea do rio Mearim, bastante afastado de casa. Eu ia à frente, Raimunda me seguia, cada um com sua bacia de alimento acomodada numa rodilha de pano sobre a cabeça.
Iamos apressados quando, de repente, uma enorme cobra caninana, colubrídeo (Spilotes p. pullatus), surgiu aos meus pés. Gritei e dei um enorme salto para trás, atirando a bacia de comida sobre Raimunda. A beirada da bacia machucou-lhe a boca, quase quebrei-lhe os dentes. E não é preciso dizer como foi que ficou a comida depois desse tombo. Misturou-se tudo dentro do pano: arroz, feijão, galinha assada, torresmo e outros complementos.
Ainda bem que ficou tudo dentro do pano e foi possivel aproveitar.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

ÉS CURADO DE COBRA ?



Espada velha (uma cobra no caminho): pé-de-dorna, cachaça e veneno.

Na minha terra (Pedreiras do Maranhão), em meados do século passado, no caminho Pedreiras-Trindade, alternativa rua dos Doidos-Altamira, certa vez, passei por um teste perigoso. 
Era final da temporada das chuvas, provavelmente, abril ou maio, ocasião dos preparativos para dar início à moagem da cana e a produção de melado, aguardente, rapadura e açúcar, atividades principais da estiagem, na região.

A história começa assim
Meu Pai (José Bello), meu irmão Antônio e eu, regressávamos de Pedreiras para a Trindade, por aquele caminho tortuoso, conduzindo um animal com preciosa carga: o "Pé-de-Dorna", um tipo de garapa azeda obtida por meu pai no engenho do Sr. João Rosa, situado nos arredores de Pedreiras.
Este material destinava-se à fermentação do caldo-de-cana para produção de aguardente no engenho de meu pai, na Trindade. 
Caminhávamos em fila, atrás da mula: Antonio, eu e, por fim, meu Pai. Ali, naquele trecho de caminho do Altamira, havia um tronco de pinhão-roxo cortado, deitado ao chão, medindo de 20 a 30 cm de diâmetro. Escondida por baixo do troco estava uma cobra cinzenta, venenosa, identificada como sendo uma “Espada-velha”. 
Creio que despertou com os primeiro caminhantes e quando chegou minha vez de cruzar o tronco ela deu o bote, picando meu dedo indicador do pé esquerdo. Tomei um susto danado quando senti arder o dedo vi a cobra. 
Comecei a pular desesperadamente, tentando sair daquela situação. Quando, finalmente, consegui libertar-me, meu pai quis matar a cobra porem, ela já estava morrendo. Creio que, movido pelo pavor, a matei pisoteada. 

Resultado: meu pai espremeu o local da picada, mandou-me menter o pé na lama para lavar o veneno. 
Depois, ele queria passar pela casa do Alves, um Sr. curado de cobra, para pedir-lhe o remédio definitivo: uma cuspida na boca para matar o veneno da cobra. 
Eu me dispus a atolar o pé em todo lamaçal do caminho, para não me submeter à tortura da cuspida. 
Que remédio louco !... 
Felizmente, não tive problema. 
Daí por diante, passaram a crer que eu seria mais um privilegiado, curado de cobra, podendo, tambem, cuspir e curar.
O mais provável é que, naquela ocasião, a Espada velha estivesse tirando uma sesta, após uma refeição, ocasião em que fica desprovida de veneno, segundo dizem alguns.
Devo acrescentar que, quando ainda criança, aprendi uma oração para proteção contra picada de cobra, nos seguines termos:: "São Bento, Agua Benta, Jesus Cristo no Altar, abaixa tua cabeça cobra, deixa, em paz, o nosso povinho passar".


segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Raimunda Furtado Leite: Alguns Traços Históricos

Informes iniciais: Conforme pesquisas, Raimundo significa protetor ou sábio, pessoa muito rigorosa consigo mesma, com tendência a isolamento e a supervalorização das virtudes de outrem. Quando consciente de sua importância, pode tornar-se conselheiro e sustentáculo. Dizem ser palavra de origem francesa: do gótico "protetor, poderoso". No entanto, outros acreditam que a palavra provém de Ramiro, nome de origem alemã, de onde deriva Radamir, cujo significado é: "conselheiro ilustre, famoso". Derivando Raimón = Raimundo.

Local de Nascimento: Raimunda Furtado Leite nasceu em Pedreiras (Ma), no bairro "Anjo da Guarda" (?), em 4 de agosto de 1924, casou-se em 1939, com 15 anos de idade, com Raimundo Cesário Cruz, seu primo em primeiro grau, tendo falecido em 30 de agosto de 1964.

O Casamento: Segundo informações colhidas junto a vários familiares, o casamento ocorreu de modo singular. Os primos namoravam e tinham intenção de realizar um casamento que, por precoce, provavelmente, seria contrário à vontade dos pais. Por isso, planejaram fugir e por em prática seus intentos. Entretanto, o pai da jovem, tendo se deslocado da Trindade à Pedreiras para participar da missa dominical, lá, tomara conhecimento do plano dos jovens e, quando regressou, passou pelo Altamira para acertar as coisas. Deve ter havido uma conversa amistosa com a filha que culminou na aprovação do seu casamento. Certamente, conviria mais a ele um casamento precoce do que o vexame da fuga de dois jovens embevecidos de amor.

Localidade Altamira: Viajando de Pedreiras para a Trindade, trilhei muito pelo caminho que passa por esta localidade, quase uma trilha de roça, cortando morros e vales lamacentos povoados de palmeirais. E lembro-me bem da linda propriedade chamada Altamira. Nela havia uma bela casa, provavelmente remanescente de antiga fazenda de escravo, cercada de fruteiras, numa colina, afastada cerca de 500 metros do caminho geral. O acesso era feito por uma cancela e um corredor de cercas onde podiam ser vistos alguns exemplares senis da elegante palmeira-real, provavemente, plantados por escravo, na segunda metade do século XIX.

A Festa do Casamento: Dizem que a festa do casamento ocorreu no Altamira, na casa de tio Joaquim Cesário Cruz (Quinco Cesário), o pai do noivo, tio da noiva, propriedade situada no caminho da cidade, entre as terras dos Cardosos e Augustinhos, integrada à planície do importante Igarapé da Agricultura (1) que irriga as terras de meu padrinho Bello Xavier.

Meus pais aprovaram o casamento porém, não participaram. Fizeram-se representar por minha irmã Maria e seu esposo Manoel Martins dos Santos (Nezinho).

Onde Residiram: Não tenho informação sobre o local de residência do novo casal durante os dois primeiros anos de vida conjugal, provavelmente lá mesmo no Altamira. O certo é que, em outubro 1941, residia na Trindade, numa antiga casa, à beira do riacho, onde foram construídas nossa residência definitiva e a nova casa de engenho, após o incêndio da casa da colina, do lago.

Nascimento de Inácio: Tenho lembrança de que, ali, nasceu o primeiro filho de minha irmã Raimunda, Inácio Cesário Cruz. Naquele dia, com pouco mais de 3 anos de idade, eu não sabia o que estava acontecendo do lado interno daquela casa cercada de mangueiras e laranjeiras, naquela beira de caminho do rio Mearim. Era um grande alvoroço, corre-corre, pra dentro e pra fora, e ninguém me dava qualquer explicação. Crianças não podiam chegar perto. Amedrontadas, eram afastadas dali sem qualquer explicação sobre o que se passava na casa.

Segunda Lembrança Mais Antiga: Creio que esta deve ter sido a minha segunda lembrança mais antiga, visto que a primeira, foi aquela em que meu pai salvou-me de entre os chifres dos bois Moreno e Azulão.

Seria um Novo Incêndio ?: Eu já havia presenciado a correria de um incêndio. Aquele que destruíra nossa casa da colina, acontecimento guardado apenas em meu subconsciente, pois confesso que não lembro absolutamente nada dele. Estaria ocorrendo, ali, outro incêncio ...?

Felizmente, não se tratava disto mas, dos preparativos para a chegada do meu sobrinho Inácio.

O Nome e a Promessa: O nome Inácio fora dado ao recém-nascido, segundo fui informado, para assegurar-lhe a sobrevivência, tendo em vista que três outras crianças nascidas anteriormente, não haviam sobrevivido.

Pesquisas apontam que Inácio significa ardente e indica uma pessoa vivaz e inteligente que, em geral, amadurece com as dificuldades. Supera obstáculos com bom humor e perseverança. Há quem atribua ao nome Inácio origem etrusca. O fato é que, na história, aparece registrado como sobrenome pelos antigos romanos.

Relatos de Sinhara e Judite:

A seguir, apresento um relato elaborado por minhas irmãs Judite e Sinhara sobre esta matéria: "Primeiro vamos falar sobre a nossa casa na trindade, a 1ª casa foi queimada em 1940 + ou - em dezembro. Depois que a casa queimou, fomos morar na casa do engenho no mesmo lado do lago, o caminho ficava no meio entre a queimada e o lago. Perto da casa do engenho tinha um caminho que ia até o brochado (2). Nezinho morava no mesmo lado, em uma lombada, antes da casa do engenho velho; de lá, ele via o fogo e foi ajudar a apagar. Os moradores da Trindade, ao ouvirem a zoada do fogo na casa, pensavam que era barulho de avião, algo difícil de se ouvir, na época. Somente após se haver espalhado a noticia os moradores correram e, certamente, ainda puderam ajudar no salvamento. Foi aproveitado apenas um pouco do milho e do arroz. Na casa do engenho não dava para morar, então o Pai comprou uma casa do Sr. Alípio. Ela ficava próxima ao terreno onde ele construiu, posteriormente, a morada definitiva. Uma bela casa de taipa, coberta de telha".

"Sobre Raimunda: ela não chegou a fugir. Pai havia vindo a Pedreiras onde ouviu boatos afirmando que Raimundo Quinco iria roubá-la, e que o Pai dele estava de acordo. Nosso Pai passou lá, no Altamira, e declarou que não precisavam roubá-la. Afirmando que, mesmo contra sua vontade, iria aceitar o casamento e, gostaria que o mesmo fosse realizado logo.

Quando ela casou, ficou morando em Altamira, logo ficou grávida e acabou perdendo (sofreu um aborto) com poucos meses, depois do 2º aborto ele mudou para a Trindade, para a casa da beira da estrada, perto da bagaceira do engenho. Ele foi trabalhar no engenho do sogro. Houve o 3º aborto. Então aconselharam que ela deveria fazer uma promessa com Santo Inácio para não mais perder as crianças. A promessa era assim: o primeiro filho que nascesse vivo e de tempo normal se chamaria Inácio. Feita a promessa, a gestação transcorreu normal, a criança nasceu em paz e recebeu o nome Inácio, como prometido. Dai por diante, nasceram-lhe e foram criados mais 12 crianças.

OBS: conforme prometido, são palavras da minha mãe Judite e da tia Sinhara....um abraço....Janaina.

(1) O nome indica que a extensa planície cortada por este grande Igarapé suportou, por longo tempo, um avançado e produtivo projeto agrícola. Aquele campo agrícola foi abandonado e tomado pela vegetação secundária, especialmente, de assa-peixe e cambará-chumbinho. Enfeitando algumas cercas próximas ao povoado dos Bellos havia, ainda, alguns pés de eucalipto (árvores enormemente longas e retilíneas), testemunhas vivas dos áureos tempos daquele empreendimeto rural.

(2) Uma região de lagos, planície inundável do rio Mearim, onde se faziam as plantações de vazantes, especialmente de melancia e melão

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Morada provisória e a nova residência


Mudança para o galpão: A vida precisava continuar. Então, juntou-se o que havia sobrado do incêndio e fomos residir provisoriamente no galpão do engenho, na baixada, mais próximo ao lago. Neste galpão, ficamos abrigados durante o tempo que foi necessário à construção da nossa nova residência.
Não me contaram por quanto tempo, ficamos no galpão da beira do lago, convivendo diretamente com o barulho, a poluição, o cheiro de engenho e a luta diária dos tralhadores.
A Nova residência: Ela foi erguida em local bem mais afastado do lago, num aplainamento feito no sopé de uma colina, tendo à frente larga planície por onde serpenteava respeitável igarapé. Havia um amplo terreiro por atrás da casa e, um barranco elevado mostrando o barro amarelo-pardacento daquele importante prolongamento do relevo do Morro da Trindade. Estas elevações eram quase totalmente cobertas por vegetação florestal que foi conservada por meu pai durante todo o tempo em que ali residimos. Na orla da floresta, foram plantadas algumas limeiras cujos galhos debruçavam-se sobre o barranco e serviam de refúgiol, especialmente, para porcos e galinhas, nas horas de sol forte.
Foi esta residência que me viu crescer. Ela tornou-se a minha casa-mãe, que aprendi a amar e a conhecer, em todos os seus detalhes, compartimentos, móveis e utensílios. Cada sala, cada quarto, cada espaço tem uma história que me vincula e emociona. Foi meu lar amigo durante cerca de 12 ano, até quando nos mudamos para Pedreiras, por volta de 1952/1853.
(vai cont...)

TRÁGICO FIM DA NOSSA CASA NA COLINA DA TRINDADE




Fogo na Residência: Creio que vivíamos no final de 1939 ou início de 1940, ocasião em que a produção já havia sido recolhida ao celeiro. Os paióis estavam repletos de arroz (amontoado em cacho) e milho ( em espiga).
A luta da familia continuava, quando ocorreu o desastroso incêndio de nossa casa, marcando profundamente a vida de todos nós.
Tudo ocorreu por conta de um inconveniente ninho de inseto, uma casa de maribondo "enxu" muito comum na região. (Inseto himenóptero, vespídeo (Polybia scutellaris), de coloração preta, com dois traços amarelos, transversais, quase unidos, no meio do dorso. Constrói o ninho, esférico, com quase dois palmos de diâmetro, nos beirais das casas ou nas janelas).
Um grande ninho foi construído na cumeeira de nossa casa e sua rica produção de mel passou a “adoçar” e a agitar a dormida de meus pais, especialmente, de minha mãe, subtraindo-lhes o merecido repouso.
A mãe já havia solicitado providências a meu pai a respeito daquele meloso vizinho. Porem, suas múltiplas responsabilidades ainda não lhe haviam permitido solucionar o tal problema. Como minha mãe não era muito de esperar, resolveu tomar providência.
Ela já havia visto Nezinho, seu genro, realizar uma operação dessas.
Foi numa bela manhã ensolarada de domingo, após uma daquelas noitadas chuvosas de matar sapo, muito comuns na região, que ela deliberou o audacioso e inflamado evento.
Meu pai havia saído muito cedo, acompanhado de meu irmão Antônio, a fim de comprar os suprimentos semanais, na cidade. Na casa, estavam apenas duas pessoas adultas: ela própria e sua filha mais velha, Maria.
Trabalhava também com meus familiares, na ocasião, o Pedro Martins, um irmão de Nezinho, que sofreu muito com o paludismo. Era um jovem alegre e brincalhão. Quando chegava da roça, para o almoço, ao entrar na casa da colina, citava passagens bíblicas para minha mãe: "Dona Conceição, dá de comer a quem tem fome" ! Também este havia ido à cidade naquele dia.
Meu irmão Sinhô, cerca de 12/13 anos de idade, único homem da casa, naquele momento, tornou-se, também, a figura chave, com quem minha mãe poderia contar para aquela perigosa operação incendiária.
Considerando que havia chovido bastante durante a noite, ela confiava no pleno sucesso daquela intervenção cirúrgica "maribúndica" e resolveu queimar os ninhos (o nosso, e o dos marimbondos), usando uma tocha de palha seca de milho, untada em querosene, presa num talo de palmeira.
Creio ser aquilo uma experiência inédita para ela, senhora de orações, muito confiante na providencia divina. Confiava também na humidade da cobertura da casa, como facilitadora do controle das chamas, embora soubesse que, a chuva só havia molhado por fora.
Talvez ela não tenha imaginado que a cera e o mel pudessem imediatamente incrementar a combustão da palha. Este foi o quadro que se desenhou aos nossos olhos espectadores.
Sinhô, bastante solicitado, bem que tentou, por todos os meios possíveis, conter as chamas antes que se propagassem. Procurou apagar o fogo por cima e por baixo da cobertura. Tudo em vão... Estava consumada a grande tragédia e, diante das circunstâncias, não havia mais nada a fazer senão, encarar o problema com os braços e pernas existentes.
Havia apenas duas pessoas adultas (Mãe e Maria) e Sinhô (12/13 anos). Os demais, crianças com menos de oito anos: Cesário, Sinhara, Judite, eu e Socorro, minha sobrinha. Raimunda, provavelmente, já havia se casado e, nesta época, não residia conosco.
A casa não tardou a se extinguir sob a violência das chamas e nosso olhar de pavor. Os paióis de milho e arroz ainda bem que tiveram queimadas apenas as camadas superficiais. Muita coisa foi retirada, depois, do meio da fumaça.
Ao cair da tarde, chegando da cidade, meu pai ainda avistou, ao longe, a fumaça emanando da verde colina. Não sei que pensamento lhe ocorreu. Porem, o mano Antônio, ao ver de perto o que restou, no meio do carvão e da fumaça, exclamou chorando: “Oh Meu Deus!.., queimou-se meu facãozinho!...” Ele era muito cuidadoso com sua ferramenta de trabalho.
Disseram-me que durante a correria para salvar do incêndio o que fosse possível, eu e minha sobrinha Socorro, crianças com 2 a 3 anos, muito atrapalhamos, correndo apavorados para dentro e para fora, atrás das pessoas, naquela maratona maluca de salvamento.
Dizem que alguns moradores da região chegaram a ouvir o barulho do incêndio porem, confundiram-no com zoada de avião e não deram maior importância.
Foi o fim da nossa casa da colina, na beira do lago da Trindade.